domingo, 3 de junho de 2012

Tratamento natural de esgoto


 

 

 

Tratamento natural de esgoto


Municípios brasileiros fazem experimentos no uso de ecossistemas artificiais para tratar água e esgoto de forma mais barata e sustentável às tradicionais ETEs


Por Caroline Mazzonetto

Fotos: Alessandro Maschio Campieli
Wetland é uma palavra sem tradução específica para o português. Refere-se a pântanos alagados, brejos, mangues de água doce e salgada, várzeas - interfaces entre uma área úmida e outra seca. Há wetlands no mundo inteiro, desde a Sibéria até os Everglades, passando pelo Pantanal e região Amazônica, sempre com a função de ajudar na limpeza e manutenção da harmonia natural. Nesses ambientes, as plantas tendem a se aglomerar e sua tendência é modificar e controlar a qualidade das águas, removendo segmentos e nutrientes. Se a natureza é capaz de fazer isso com seus rios e lagos, por que não aplicar essa solução para melhorar os resíduos líquidos que são gerados diariamente pelo homem?
A ideia de wetlands construídos não é nova e vem sendo aplicada com sucesso lá fora. No Brasil, embora ainda vá longe o dia em que essas estruturas se tornarão uma alternativa corriqueira quando se fala em saneamento, alguns municípios como Analândia (SP), Piracicaba (SP), Pederneiras (SP), Alagoinha (BA) e São Paulo têm desenvolvido experiências de construção artificial de ecossistemas que agem conforme os princípios básicos das wetlands naturais, com bons resultados em custo e benefício.
"Wetlands são banhados construídos, tratamento por zonas de raízes, leitos filtrantes plantados", cita o professor da USP Marcelo Nolasco, especialista no tratamento de águas residuárias. O sistema é geralmente estruturado em tanque escavado no solo, longo e em geral retangular, que é preenchido com determinado material (pedra brita, pedra de jardim ou areia grossa). Sobre esse material são colocadas plantas tolerantes ao esgoto que se busca tratar.
O líquido entra no tanque por um lado e deve necessariamente passar por todo o seu comprimento, pondo-se em contato com as raízes. "O processo de atravessar lentamente o canal com pedras e plantas é o que acaba resultando num bom tratamento. A água vai sair do outro lado praticamente limpa", afirma Nolasco.
Com o passar do tempo, o ambiente favorece o aparecimento de bactérias habituadas a consumir substâncias do esgoto e que acabam tendo um papel importante no processo. Mas para que essas bactérias sejam aeróbias, o wetland não deve ultrapassar 1 m de profundidade, garantindo que toda a coluna tenha ar. Em uma profundidade maior entram em cena as bactérias anaeróbias, que atuam na ausência de oxigênio e liberam gás metano.

Quanto às plantas, geralmente usa-se macrófitas, como aguapé. Tendo em vista que o esgoto envolve maior salinidade, ele não é adequado para todos os tipos de vegetação. As que se adaptam melhor são as que crescem perto de margens de rios, de áreas alagadas e já estão acostumadas a um sistema mais rústico.
O sistema de wetlands tem apresentado bons resultados no tratamento de esgoto doméstico, de efluente agrícola, de runoff urbano, de barreiras de retenção, no tratamento de grandes volumes de água de rios e na recuperação de áreas alagadas. As principais vantagens no uso da solução são o baixo custo de implantação e de operação com eficiência alta na melhoria dos parâmetros de qualidade de recursos hídricos, além da criação de local de refúgio e nidificação para a fauna e potencial produção de biomassa para uso na produção de ração animal, energia, biofertilizantes entre outros.

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Tratamento natural de esgoto


Municípios brasileiros fazem experimentos no uso de ecossistemas artificiais para tratar água e esgoto de forma mais barata e sustentável às tradicionais ETEs


Por Caroline Mazzonetto

Fotos: Alessandro Maschio Campieli
Plantas macrófitas, como aguapés, são as mais utilizadas em wetlands construídos porque têm a capacidade de sedimentar materiais em suspensão


Diferentes tipos
"Wetlands construídos são uma tentativa de reprodução do que a natureza faz", explica o arquiteto e urbanista Eneas Salati Filho. Diretor do Instituto Terramax e doutor em manutenção e manejo de recursos, ele participou de boa parte dos projetos de wetlands em operação no Brasil ao lado do pai, Eneas Salati. Segundo o arquiteto, há diferentes tecnologias para a construção de wetlands artificiais, sendo que cada wetland é construído levando em conta o tipo de efluente que deve ser tratado e o volume a ser gerenciado, o que vai interferir na área construída e no tipo de plantas a serem adotadas. Também há influência do clima (quanto mais quente, melhor), se o fluxo do esgoto é ascendente ou descendente, e - pensando em canais de macrófitas sem a presença de pedras, somente de vegetação - se a planta é flutuante ou emergente. A dica é sempre primar pela diversificação na composição do wetland.
Para chegar a uma maior eficiência, a saída é aliar um sistema de solos filtrantes ao canal de plantas macrófitas. O sistema de solo, que tem filtragem física além da absorção das plantas, é instalado com cerca de 80 cm de profundidade. Primeiro, é feita a impermeabilização para que o esgoto não contamine o solo; depois, é colocada uma camada de brita e tubos perfurados para ajudar o fluxo do líquido. Em cima da brita vai a terra, uma mistura especial do solo da região mais bagaço de cana-de-açúcar ou casca de arroz, além de vermiculita expandida, para aumentar a capacidade catiônica. E em cima, cultiva-se arroz, uma macrófita. Desse modo, a ação depuradora dos solos filtrantes se processa como filtro mecânico, físico-químico e biológico.
Após passar por esse sistema de solo filtrante, o esgoto já tratado vai para o canal de macrófitas de cerca de 50 cm, previamente impermeabilizado e onde acontece a próxima etapa, com a presença de plantas flutuantes ou emergentes.
Vantagens não faltam. A primeira é a versatilidade: os wetlands servem não só para tratamento de efluentes, como também para o tratamento de água para consumo (veja casos reais retratados à parte). É um sistema modulado (podendo atender uma família ou um milhão de pessoas), esgoto urbano, doméstico ou industrial - desde que seja projetado para tal - de efluente agrícola, de runoff urbano, de barreiras de retenção, no tratamento de grandes volumes de água de rios e na recuperação de áreas alagadas.
O wetland pode ser instalado com materiais abundantes na região, como conchas em vez de pedra em uma vila litorânea. O custo é baixo, variando em função da topografia, mas se resume à manta plástica para a impermeabilização, o tubo perfurado e a brita. Os benefícios são altos: eficiência alta na melhoria dos parâmetros de qualidade de recursos hídricos, além da criação de local de refúgio e nidificação para a fauna e potencial produção de biomassa para uso na produção de ração animal, energia, biofertilizantes entre outros.
Para uma estação de tratamento de água ou esgoto desse tipo funcionar não é preciso equipamentos, motor ou gerador: tudo ocorre por gravidade, sem bombeamento, injeção de ar ou adição de químicos. "Se otimizar o tratamento biológico da água, fica muito mais fácil e mais barato", concorda José Alberto Ferro, gerente de recursos hídricos metropolitanos da Sabesp. Porém, há uma limitação: como precisa de uma área considerável para ser instalado, o wetland não pode ser aplicado em regiões excessivamente urbanizadas, como São Paulo.
A seguir, conheça quem está aplicando o sistema para tratamento de água e esgoto, e os resultados obtidos.

Wetlands em números

Tempo de residência (período que o esgoto fica dentro dos canais de um sistema de wetlands enquanto está sendo tratado):
10 horas, 12 horas até quatro ou cinco dias - dependendo da qualidade que se busca
Remoção média de coliformes observada: 99%
Remoção média registrada de fósforo: 75% a 80%
Demanda Biológica de Oxigênio - DBO (o que existe de matéria orgânica no efluente): 99%

Fonte: Eneas Salati Filho


Instalações de wetland da Estação de Tratamento de Esgoto do Engenho, em Piracicaba (SP)
Piracicaba: 99% de eficiência na remoção de coliformes fecais
A Estação de Tratamento de Esgoto do Engenho é vinculada à Secretaria Municipal de Água e Esgoto de Piracicaba (Semaer) e atende a 1,1 mil habitantes do bairro Terras do Engenho. O projeto foi desenhado de forma que as águas residuais passem primeiro pelos solos filtrantes, que combatem melhor os coliformes fecais - com o benefício de que o cheiro ruim não fica na superfície -, e só depois sigam para o canal com as plantas aquáticas. O sistema envolve o uso de fossas sépticas como tratamento primário, enquanto as demais etapas equivalem ao tratamento secundário e terciário. O sistema de wetland construído no Engenho de Piracicaba tem vazão média atual de entre 0,8 l/s a 1 l/s, com volume útil (da caixa de decantação/ equalização) de 96 m³. A área do sistema de despoluição hídrica com solo (DHS) é de 3 SF de 375 m² cada: são três solos que funcionam em paralelo, de forma que sempre há dois funcionando e um em repouso, sendo o revezamento trocado aproximadamente a cada dez dias. O canal de macrófitas tem 1,5 mil m³, e o esgoto tem tempo de residência de 13 horas. Com esta solução, a ETE tem registrado um índice de eficiência acima de 84,5% para Demanda Biológica de Oxigênio (DBO), referente à matéria orgânica; e de 99% para coliformes fecais. Veja resultados detalhados, em tabela à parte



Tratamento natural de esgoto


Municípios brasileiros fazem experimentos no uso de ecossistemas artificiais para tratar água e esgoto de forma mais barata e sustentável às tradicionais ETEs


Por Caroline Mazzonetto


Sabesp: wetland-piloto
A Sabesp pretende implantar uma wetlandpiloto próximo à estrutura de transferência de água da Represa Billings para a Guarapiranga, na região metropolitana de São Paulo. O objetivo é estudar as plantas aquáticas macrófitas da região e descobrir qual configuração uma wetland deve ter para obter a melhor remoção de fósforo possível. Com esses dados em mãos, o passo seguinte será recompor a wetland natural do rio Parelheiros, que deságua na Represa Guarapiranga e se encontra em processo de assoreamento e aterramento. Assim, não haverá a instalação de uma wetland artificial, mas a reconfiguração de uma natural já existente. Dois tanques de 15 mil m² serão construídos para abrigar a pesquisa. Estão previstos dois anos de observação até que se saiba quais são as plantas nativas que melhor eliminam o fósforo do ambiente aquático. O foco da pesquisa neste elemento se deve ao fato de este ser um nutriente que atua no desenvolvimento de plantas aquáticas e algas, e que se existir em excesso na água da represa causa aumento do material orgânico, provocando grande consumo de oxigênio e prejudicando a vida aquática.



Fotos: Cláudio Alex G. Carvalho/Prefeitura Municip
Canal de curso d'água com macrófitas e bombas dosadoras de cloro e flúor em etapa final de tratamento na Estação de Tratamento de Água de Analândia
Analândia: wetland para tratamento da água
A Estação de Tratamento de Água com uso de wetlands construída na cidade funciona desde 1998. À época, a prefeitura integrou parte dos recursos e a obra foi realizada com verba do Ministério do Meio Ambiente para servir de demonstração. O sistema é projetado para atender até 6 mil pessoas (o município possui 4.294 habitantes), e atua junto a uma rede de outros sete poços artesianos e sistemas de drenagem. Trata-se de uma das poucas iniciativas do gênero, senão a única, em funcionamento no Brasil. A água vem do Córrego Retiro (afluente do rio Corumbataí) e passa pelo canal de macrófitas; depois, segue para o sistema de solos filtrantes sobre os quais há cultivo de arroz e, no final, está pronta para receber cloro e fluoretação, para então ser armazenada e ser distribuída. No processo, não há adição de sulfato de cloro ou sulfato de alumínio e a água que sai na outra ponta do sistema atinge os padrões de potabilidade. O sistema implantado na ETA segue os parâmetros relacionados a seguir:
- Vazão: 15 l/s;
- Canais de plantas flutuantes: 90-105 cm de altura da lâmina d'água, 1.780 m² (total); Solos filtrantes: 10-14 cm de altura da lâmina d'água, 1.008 m² (cada um - são dois módulos que funcionam alternadamente);
- Eficiência obtida: Turbidez - 90,9%; N-Amoniacal - 100%; Nitrato - 68,6%; Nitrito - 86,7%; Coliformes fecais - 99,9%; Coliformes totais - 99,9%; DBO (Demanda Biológica de Oxigênio) - 85%; DQO (Demanda Química de Oxigênio) - 87%.


Divulgação: Marcelo Nolasco
USP-SP: wetland contra chorume
Fruto de um convênio com a Unesco, uma pesquisa que está sendo desenvolvida por professores e alunos da Escola de Ciências, Artes e Humanidades da USP vai tentar mostrar qual a eficiência do wetland quando se fala do chorume de aterro sanitário, um líquido mais forte e complexo que o esgoto e muito mais difícil de ser gerenciado. Coordenada pelo professor Marcelo Nolasco, a equipe começou a monitorar o sistema há algumas semanas. Para reproduzir as condições de um wetland em miniatura, os pesquisadores usam tanques em escala de bancada (pequenas caixas parecidas com engradados) na medida de 13,6 mudas por metro quadrado (eles trabalham com três tipos de plantas aquáticas). No experimento, o chorume é diluído e entra nos wetlands em um sistema de fluxo ascendente, para sair do outro lado já tratado


Como é feito o tratamento de esgoto?

por Rodrigo Ratier
O princípio das estações de tratamento é dar uma turbinada no processo natural de limpeza que qualquer rio faz. Todo curso d’água possui bactérias que se alimentam da matéria orgânica do esgoto e ajudam a eliminar a sujeira. Mesmo o combalido Tietê, um dos rios mais poluídos do mundo, consegue eliminar boa parte das 400 toneladas de esgoto que recebe por dia. Cerca de 200 quilômetros depois de receber toda a sujeira da Grande São Paulo, ele volta a ter peixes e condições para a prática de esportes aquáticos. "A diferença é que uma estação de tratamento faz o serviço muito mais rápido. Como ela possui microrganismos em concentração milhares de vezes superior à de um rio, dá para reproduzir em algumas centenas de metros a mesma limpeza que um rio demora até 140 quilômetros para fazer", afirma o químico Moacir Francisco de Brito, da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp).
Para diminuir as impurezas presentes no esgoto, o trabalho envolve ao menos cinco etapas até que a água possa ser devolvida ao ambiente. A idéia é começar barrando a sujeira visível a olho nu - de geladeiras a fios de cabelo -, depois eliminar grãos de terra, partículas em suspensão e por fim atacar as impurezas solúveis na água. "O tratamento remove até 95% desses dejetos, fazendo com que a água possa ser usada na limpeza de ruas, na irrigação, ou ser devolvida sem perigo aos rios", diz Moacir. A tarefa é demorada e cara, mas vale a pena se for encarada como um investimento a longo prazo. A Organização Mundial da Saúde (OMS) calcula que, a cada dólar aplicado em saneamento e tratamento de esgoto, economizam-se 5 dólares em atendimento médico. No Brasil, onde só 16% dos esgotos urbanos são tratados, quatro em cada cinco doenças são causadas por água ou esgoto sem tratamento adequado.
Purificação turbinada O segredo é reproduzir o processo de limpeza natural de um rio, só que bem mais rápido 1 - A primeira etapa do tratamento é barrar o lixo sólido que vem junto com o esgoto. Para reter o material pesado, duas linhas de grades (a primeira com 10 centímetros de espaço entre as barras e a segunda com 2 centímetros) impedem a entrada de tocos de madeira, garrafas de refrigerante, pedaços de papel e fios de cabelo que chegam por uma impressionante tubulação de 4,5 metros de diâmetro
2 - A fase seguinte, chamada de desarenação, serve para retirar a terra e a areia que se misturam à sujeira. No fundo de uma grande caixa, um tubo joga ar na água, fazendo com que as partículas em suspensão formem uma espiral e se depositem no fundo. A retenção também evita que o atrito dos sedimentos estrague as bombas que impulsionam o líquido no tratamento
3 - Pequenos grãos de dejetos e de fezes são eliminados na chamada decantação primária. Por serem mais densos, esses tipos de resíduo tendem a ficar acumulados no fundo do tanque. Em seguida, uma pá que se move lentamente empurra a massa sólida para uma espécie de ralo. De lá, esse lodo segue para outro setor do sistema de tratamento, podendo se transformar em adubo ou ser usado para gerar energia
4 - A água do esgoto inicial, ainda suja, vai para o tanque de aeração, habitado por uma rica fauna de bactérias e considerado o coração da estação de tratamento. Lá, um tubo injeta microbolhas de ar, que ativam a voracidade desses microorganismos. Alimentando-se da matéria orgânica dissolvida no esgoto, os bichinhos do tanque comem a sujeira em uma velocidade milhares de vezes maior do que em um rio
5 - O líquido que sai do tanque de aeração está quase limpo, mas ainda sobraram as bactérias. Por sorte, elas também são mais densas que a água e se agrupam no fundo do tanque. Aí começa a chamada decantação secundária: em tanques redondos, uma pá giratória separa os microorganismos da água limpa e manda-os de volta ao tanque de aeração
6 - Depois de tratada, a água que sai da estação está pronta para ser devolvida ao rio. A eficiência do processo é grande: no total, algo em torno de 90 a 95% da carga orgânica chega a ser removida. Além disso, a concentração de oxigênio pode até ajudar na limpeza dos cursos d’água, dando uma forcinha para que a natureza se encarregue do resto da tarefa
7 - Mesmo que o produto final seja uma água bem mais limpa, ela ainda apresenta alguns organismos causadores de doenças. Para ser reutilizada, ela é filtrada e clorada em uma estação de utilidades. Depois disso, a água serve para irrigação e uso industrial, mas ainda não é potável. Nesse ponto, sua qualidade equivale à das represas usadas para o abastecimento das cidades
veja também....
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