CRACOLÂNDIA BRASIL
Viramos
uma imensa cracolândia. Temos, hoje, 800 mil consumidores de crack. Há
dez anos, eram 200 mil viciados. O crescimento foi tremendamente
acelerado. Outros países, como os Estados Unidos, sofrem também do mesmo
mal. Só que, ali, a epidemia teve o seu auge nos anos 80. Em 1988, 2,5
milhões de americanos eram consumidores da droga. Com as políticas
públicas postas em funcionamento no país do norte, os números foram
caindo progressivamente. Em 2002 eram 337 mil viciados. Hoje esse número
caiu para 83 mil. A epidemia do crack está no seu ponto mais alto,
hoje, no Brasil. Segundo estudos divulgados pela revista Veja (“É pior
do que parece”, edição 2252, 18/01/ 2012 e “O crack bate à nossa porta”,
edição 2253, 25/01/ 2012), dados coletados em 4430 municípios revelam
um fato estarrecedor: 91% das cidades foram invadidas pelo crack. É uma
estatística deveras trágica, pois a invasão da droga da morte se traduz
num aumento extraordinário de criminalidade, notadamente de homicídios, o
que torna o país um dos mais perigosos do mundo. A desgraça da droga
disseminou-se democraticamente pelo Brasil afora, sem poupar ninguém:
pobres, remediados e abastados são hoje vítimas da maré assassina. Para
todos eles, as portas de entrada para o crack foram o álcool, a maconha e
a cocaína. A recente operação da polícia paulista na cracolândia
revelou esse perfil universal da droga, que abarca todas as classes
sociais.
A
percepção pela sociedade do tamanho do mal ensejado pelo consumo de
drogas é, via de regra, tardia. Acontece em nível macro o mesmo fenômeno
que ocorre com a percepção do fenômeno em escala familiar: as pessoas
procuram negá-lo e só o reconhecem quando já está instalado e começou a
produzir efeitos de desagregação social, que se traduzem em mortes
violentas, agressões contra mulheres, crianças e idosos, roubos,
assaltos, etc. É mais fácil não reconhecer a dependência das drogas do
que enfrentá-la. No Brasil, demoramos muitos anos até reconhecermos que o
crack está afogando o país. O evento que fez acordar a opinião pública,
em nível nacional, foi a operação da polícia na cracolândia paulista,
no início de 2012. Lembro-me de que, quando cheguei ao Brasil em 1979,
fugindo da guerra das drogas na Colômbia, ficava espantado de ver a
tolerância e a ingenuidade das pessoas em face do consumo de
entorpecentes. Festinhas universitárias eram regadas a cocaína. A
maconha tinha-se tornado, já nos anos 80, droga de consumo generalizado
entre a classe média. A socialite carioca Narcisa Tamborindegui, no seu
livro intitulado: Ai, que loucura, gabava-se de receber, no seu luxuoso
ap. da Avenida Atlântica, no Rio, via moto-boy, generosas doses de
cocaína para os seus convidados. Em mesa-redonda programada em Juiz de
Fora por uma entidade universitária, ouvi de um médico da prefeitura a
seguinte aberração, no início dos anos 90: “a questão de consumo de
drogas é de foro interno, diz relação apenas à satisfação individual; se
você quiser consumir em casa, tudo bem, é só tirar as crianças da sala e
mandar ver”. Numa outra mesa-redonda, na PUC do Rio, nos anos 80, já
tinha ouvido de um psiquiatra a sábia recomendação, ao Estado, para que
financiasse a fabricação e distribuição de um bagulho oficial, que ele
batizava de “maconhol”. Tudo se passava no Brasil, para o meu espanto,
como ocorrera na Colômbia. Ali, as drogas invadiram todos os estratos
sociais, corromperam a política, a magistratura, as Forças Armadas e a
polícia, fazendo mergulhar a sociedade numa desastrosa guerra que
desestabilizou as instituições e tornou as famílias reféns dos
traficantes. Saldo da loucura patrocinada pelas drogas: 450 mil mortos
entre 1979 e 2005, na guerra civil patrocinada pelos cartéis de
Medellín, de Cali, dos paramilitares e das FARC.
A
expansão da fabricação, circulação e consumo de drogas no Brasil não foi
uma circunstância fortuita, mas uma decisão friamente planejada pelas
máfias do narcotráfico que, no final dos anos 80, consideravam ser
necessário transferir o eixo da produção e circulação de narcóticos dos
Andes para a costa brasileira e a Amazônia. Isso em decorrência do
combate que o governo americano e as autoridades dos países andinos
deflagraram contra os traficantes. O Brasil apresentava ainda a vantagem
de ter fronteiras secas mal vigiadas e uma grande extensão litorânea
sobre o Atlântico Sul, com portos numerosos e sem policiamento efetivo. O
nosso país, consideravam ainda os mafiosos, oferecia a vantagem de
oferecer um rico calendário de festas multitudinárias, como o carnaval e
os festivais de rock, onde, certamente, haveria um incremento
significativo do consumo de entorpecentes. Outra vantagem: o grande
número de imigrantes vindos dos quatro cantos do mundo, o que facilitava
a presença, entre nós, de “mulas” a serviço do narcotráfico. A julgar
pelo estado lamentável em que nos encontramos, com praticamente todos os
municípios brasileiros invadidos pelos traficantes e com a presença de
viciados, não se enganavam as máfias nos seus cálculos originais.
Um
fator veio agravar enormemente o problema do narcotráfico no Brasil: os
governos populistas, tanto no plano estadual, quanto em nível federal.
Foi decisiva para a acelerada penetração do narcotráfico no Rio de
Janeiro a dupla eleição de Leonel Brizola para o governo do Estado, ao
longo dos anos 80 e 90. A maluca tese do “socialismo moreno”, que
tornava os morros santuários da marginalidade, aonde não entrava a
polícia, fortaleceu os pequenos traficantes e os tornou praticamente
invencíveis no confronto com as foras da ordem, bastante minadas, aliás,
pela corrupção, que deu ensejo ao fortalecimento da “banda podre” ainda
em atividade e com ramificações, nos dias atuais, entre as milícias. O
populismo, no plano federal, tornou-se explícito nos dois governos de
Lula, e nas suas alianças pseudo-estratégicas com populistas de
carteirinha como Chávez, na Venezuela, e Morales, na Bolívia, ambos
afinados com o samba doido do socialismo bolivariano.
Abriram-se
as comportas para a presença, entre nós, de “representantes
internacionais” das FARC, acobertadas generosamente por Chávez em
território venezuelano e beneficiadas com a cega estratégia do Foro de
São Paulo, que tinha como finalidade o combate ao imperialismo ianque,
mediante o fortalecimento do comunismo latino-americano e,
evidentemente, do narcoterrorismo das FARC. O narcotráfico boliviano
aproveitou o ensejo e passou a despachar para o Brasil cada vez mais
toneladas de cocaína, para o consumo dos nossos narco-dependentes e para
o comércio internacional. Os “representantes” das FARC no Brasil
ajudaram a acelerar a penetração de traficantes na Amazônia brasileira.
Foi lamentável a fotografia do presidente Lula, na Bolívia, no palanque
abraçado a Morales e ostentando, junto com ele, um colar de folhas de
coca.
A
massiva entrada de toneladas de cocaína pela fronteira com a Bolívia e a
mudança do eixo de exportação da droga para a Europa, via África
Ocidental, fez com que, nos últimos anos, se deslocasse a fronteira de
exportação de tóxicos do Sudeste para o Nordeste do Brasil. Afinal de
contas, era muito mais fácil fazer chegar a droga aos portos africanos
desde o Nordeste brasileiro, distante apenas seis horas de vôo. Isso
produziu o fenômeno que estamos presenciando, de violência
indiscriminada nas cidades nordestinas, mal aparelhadas para o combate
aos traficantes. A área destinada à produção de cocaína pelo governo
boliviano praticamente dobrou: passaram a ser cultivadas vinte mil
hectares, enquanto Morales, na fase inicial, tinha delimitado a produção
a dez mil hectares. Tudo isso sob as bênçãos do socialismo bolivariano e
da retórica esquerdizante da Unasul. E, evidentemente, com a ciosa
colaboração do governo brasileiro, guiado nessa desastrosa empreitada
pelo ideólogo de plantão, Marco Aurélio Garcia e o chanceler petista dos
governos Lula, Celso Amorim. Sobre eles, certamente, recairá o peso do
julgamento da história, como os responsáveis pelo acelerado crescimento
do comércio da morte, graças ao tresloucado populismo que franqueou as
nossas fronteiras aos traficantes andinos.
Como
enfrentar o desastre do crack no Brasil? É necessário, em primeiro
lugar, identificar os erros do passado que conduziram ao estado de
desagregação presente, a fim de que não os repitamos. É imperativo, em
segundo lugar, unificar esforços da sociedade civil e dos governos
federal e estaduais, a fim de formular políticas públicas que façam
frente à desgraça do comércio da morte, combatendo, com denodo, a
produção, a comercialização e o consumo de crack. O combate ao consumo
não é fácil e, certamente, não se restringe à descriminalização de
algumas drogas como a maconha. Ela continua sendo, apesar das atitudes
politicamente corretas, porta de entrada para o consumo da cocaína e do
crack. Pareceu-me muito sensata a posição defendida recentemente pelo
prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, quando afirmava recentemente
(“Crack - Hora de unir responsabilidades”, in: O Estado de S. Paulo,
25/01/2012): “A luta contra o crack e a discussão polêmica sobre método
de internação, tratamento e recuperação de químico-dependentes estão
diariamente na mídia. É assunto tão antigo quanto complexo e merece
reflexão apurada. A realidade é que o consumo do crack começou no final
dos anos 1980 e em menos de 20 anos se difundiu por todo o País. É hoje
grave problema de saúde pública e sério desafio para o aparato policial
que tenta, na raiz do problema, conter o tráfico e a entrada da cocaína -
origem do crack - no Brasil. Trata-se de encarar uma epidemia que hoje
assola cidades médias, pequenas e até a zona rural, atingindo todas as
classes sociais. Assim, a atuação do Ministério da Saúde é bem-vinda.
Usaremos todos os recursos oferecidos, como sempre usamos, pois esse
problema só pode ser enfrentado somando esforços e verbas dos três
níveis de governo. Não é hora de apontar culpados nem de alimentar
pendengas eleitoreiras. É hora, sim, de também prover de mais recursos
as forças que combatem os traficantes. Mais investimento e maior
concatenação de ações certamente trarão resultados ainda melhores. É
hora de os protagonistas da área jurídica se debruçarem sobre os limites
legais que ainda impedem internações urgentes e necessárias”.
Ricardo ...vou tomar a liberdade de copiar o teu texto limpo...claro e colocar no meu blog (com o teu endereço ..claro)..
Acredito que o caminho que os americanos tomaram é o melhor... o usuário pego escolhe como quer ser julgado...
Nao existe o consumidor de droga dizer que é inocente.... ninguem é...
Droga pelo proprio nome não faz bem a ninguém ...e tolerancia com "pequenos" crimes é incentivar aos mesmos... e parabens pela colocaçao ao meu ex-colega engenheiro e conterrâneo Leonel... chega de endeusar um politiqueiro inconsequente... o mal que ele fez ao RIO é perguntar ao Delegado Federal e secretario Beltrame como esta sendo facil o combate diário ...sds Arlei Karpinski...http://arleik.blogspot.com
Arlei, obrigado por reproduzir o meu texto no teu blog, é hora de fazer circular a informação a respeito do combate ao consumo de tóxicos no Brasil. O problema cresceu demais e virou pandemia! Abraço.
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